quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Coisas que Escrevo 18 - Epitáfio

Um dia, estava eu a andar pelas ruas quando me deparei com uma cena diferente... Em meio a tantas pessoas a minha volta uma me chamou a atenção. Uma moça de cabelos negros e pele branca, estava parada em frente a uma casa e não tinha até então, menção de entrar. Fiquei algum tempo a observando sem saber por que, mas ali fiquei.

Um bom tempo passou e ela ali ficou, parada, olhando atentamente a porta, como se esperando algo acontecer, para decidir o que faria de sua vida. Aproximei-me e lhe perguntei “moça, porque está a tanto tempo admirando esta porta?”, ela se virou surpresa, como se aquela fosse a pergunta mais absurda que alguém poderia lhe fazer e respondeu sem se expressar muito, ela disse “porque eu quero.”.

Depois disso eu fiquei sem palavras, afinal, fora muito rude com apenas uma simples pergunta, me calei e resolvi voltar a minha própria vida. Dias se passaram e por incrível que pareça, sempre que eu passava naquele mesmo lugar, estava àquela mesma moça, com aquele mesmo rosto, com aquelas mesmas roupas, naquela mesma posição.

Cabeça dura que sou, resolvi perguntar novamente “moça, porque está a tanto tempo admirando esta porta?”, não sei ao certo se ela não havia me reconhecido ou estava em um dia mais calmo, mas sua resposta foi totalmente diferente. Ela olhou em meus olhos e disse “Ah Senhor, eu apenas estou tentando criar coragem... coisa que me abandonou a algum tempo devido a tudo o que já passei em minha vida...”. Fiquei surpreso com uma resposta tão singela porém sincera, e começamos a conversar.

Logo fiquei sabendo sobre coisas que lhe aconteceram. Seu nome era Klara, uma moça bem simples que havia se mudado para bem longe, para tentar esquecer seus problemas. Um dia percebeu que tinha deixado para trás muitas coisas, e resolveu voltar. Mas admitir que havia tomado atitudes precipitadas não era bem o seu jeito e então ficava ali, em frente a sua casa todos os dias tentando juntar a coragem necessária para adentrar. Quando ficava muito tarde ia embora para a casa de uma amiga que estava de viajem, e que a pediu que cuidasse da casa até sua volta. Eram assim todos os dias desde que havia retornado.

Conversamos durante horas e não pensei que depois de ter sido rejeitado, poderia conhecer uma pessoa tão gentil por detrás daquela parede de sentimentos. Klara começou a se abrir cada vez mais e mais comigo e passei a sempre que possível, quase todos os dias na verdade, a encontrar para estar ali ao seu lado. Conversando, ajudando e esperando que cada a dia ela tenha um pouco mais de coragem para enfrentar suas coisas.

Foi realmente diferente saber que uma pessoa poderia mudar tanto, e fiquei muito feliz. Pois agora achava que realmente eu fazia diferença em seu dia, e que ela estaria ali sempre a conversar comigo.

Em um dia meio chuvoso, ela me pediu que a acompanhasse. Não queria ficar sozinha durante o caminho de volta à casa de sua amiga eu não poderia recusar. Estava eu muito ligado a ela, e queria fazer de todo meu alcance para que ela ficasse bem. Fomos conversando, e eu comecei a perceber que aquela moça que apareceu de repente em minha vida, já fazia parte dela. Eu a acompanhei durante todo seu caminho, e conversamos até a hora de eu ir embora.

Do mesmo modo como tudo ficou bem, em um dia sem mais nem menos, as coisas mudaram drasticamente. Sem que eu entendesse o porquê, aquela moça que estava todos os dias naquele mesmo lugar, não estava mais até a frente de sua casa. No outro dia, ela também não apareceu e nem no outro, ou no outro. Não apareceu por um tempo e eu não sabia o que havia acontecido. Então eu apareci na casa onde ela estava hospedada para conversar e sim, ela me recebeu, mas estava distante e não se importava mais com o que eu tinha a dizer, e nem mais com as coisas que conversávamos. E até aquele momento eu não sabia o por que.

Foi quando aos poucos fui entendendo, ela muito timidamente começou a me dizer que não tinha certeza se as coisas estavam indo conforme a sua vontade, não sabia se realmente ela tinha um lugar para voltar, e por estar confusa com tudo o que havia lhe acontecido, achou melhor se perder em seus próprios problemas, achou melhor se afastar porque era um problema só dela.

Não consegui entender.

Se antes éramos tão próximos, porque achou que se afastando seria a melhor forma de “não se machucar”? Afinal de contas, se ela estava com algum problema, por que não foi sincera comigo e me disse o que estava acontecendo? Eu poderia ajudar. Não que necessariamente eu deveria fazer algo, mas eu poderia só ficar ao seu lado QUANDO e SE ela precisasse.

Mais alguns dias e ela voltou ao mesmo lugar de onde a conheci. Ali, na frente daquela porta, parada, olhando e pensando. E não importava quantas vezes eu passasse ao seu lado, ela nem ao menos me olhava. Só olhava fixamente à porta, ainda sim tentando juntar forças para adentrar.

Eu não conseguia mais tirar a Klara de meus pensamentos, nem de minha rotina. Eu queria estar ali para mostrar que teria algo para qual correr caso acontecesse alguma coisa,e que eu não era apenas mais um. Eu queria que ela soubesse que eu estaria ao lado dela independente das coisas que aconteceriam.

Queria que ela soubesse que eu estava ali.

Então eu, sempre cabeça dura, cheguei até Klara e perguntei novamente “moça, porque está a tanto tempo admirando esta porta?”. Tivemos então uma conversa tão franca quanto qualquer outra que eu poderia lembrar. Ela olhou em meus olhos e me disse que não precisava de ninguém e que resolveria tudo sozinha, pois queria tomar suas próprias decisões e arcar com todas as consequências que viriam a tona por ter tomado essas mesmas decisões. Ela não queria ter mais uma coisa com o que se preocupar afinal sua vida estava muito tumultuada e ela pensava em diversas coisas ao mesmo tempo. Assim, queria o tempo para suas coisas.

Foi difícil compreender o que realmente estava acontecendo. Essas mudanças tão repentinas de atitudes, como se a sua “independência” estivesse sendo ameaçada. Todos precisam de seu espaço, e fazer as coisas pensando no seu próprio bem mas eu não quero ameaçar isso. O que eu quero é usufruir de sua independência e aproveitá-la plenamente, só por estar por perto e me doar totalmente para que veja que estou ali, sempre ao seu lado.

Fiquei tentando entender o porquê Klara estava agindo daquele modo, mas a atitude que tive naquele momento foi respeitar. Afinal o que poderia eu fazer naquele momento em que ela não gostaria de mais uma preocupação. Tudo o que pude fazer foi esperar.

Mas será que essa seria a decisão mais correta a se tomar?
E se naquele momento ela estivesse precisando de alguém que estivesse com ela, mesmo ela não querendo? E se ela havia me dito aquilo para testar a minha vontade de ficar ao seu lado? E se tudo o que estou pensando agora estivesse totalmente errado?
O que seria melhor fazer?
Me arriscar fazendo algo que ela havia pedido ou fazer aquilo que eu acreditava, que seria ficar ao seu lado independente dos motivos?

Dias foram passando enquanto eu ficava em dúvida. Cada vez mais encontrava perguntas onde não acharia uma resposta, não importava o quanto eu pensasse eu não chegaria a nenhuma conclusão. Foi então que eu percebi que não adiantaria ficar pensando, pois enquanto eu não fizesse nada, nada aconteceria. Eu deveria tomar a frente e resolver em que me arriscar. Eu eu poderia ouvir algo que me desagradaria, mas quem sabe eu também poderia ser surpreendido?

Mesmo durante todos esses dias ela sempre esteve lá, parada, olhando, esperando por algo. Eu parei por mais um momento e pensei no que eu deveria fazer. Tentar mais uma vez me aproximar dela sem saber o que esperar, ou apenas a deixar com seus pensamentos e sua vida sem que eu fizesse parte dela?

Naquela tarde chuvosa eu tinha minha decisão tomada e tudo que precisei foi juntar forças para fazê-la. Me aproximei dela, olhei Klara atentamente, respirei, esperei que ela tivesse alguma reação, mas como sempre ela estava ela estática. Foi então que juntei todas as forças que existiam em mim e me virei dando minhas costas a ela.

“Por que você está tão hesitante em conversar comigo? Será que mesmo durante todo o tempo em que conversamos você não conseguiu perceber que eu agora, não consigo pensar em mais nada que não seja você? Eu sei que estou longe de ser algo para você, mas acreditei que eu poderia realmente ter encontrado alguém que valesse a pena. Alguém que estivesse disposta a estar ao meu lado, me aceitando do modo que sou. Com todos os meus defeitos e qualidades, achei que eu tivesse encontrado alguém que poderia me querer de verdade. E não acho que você não tenha pensado em algo assim, pois você não precisaria ter se aproximado de mim, se não tivesse considerado esta opção. Sei que não sou a pessoa mais bela ou o homem de seus sonhos, mas eu posso lhe fazer muito feliz se você me der a oportunidade de tentar. Eu lhe conheço pelo menos um pouco, e sei que o que você precisa é de alguém que lhe motive e que lhe dê forças para resolver seus problemas. Alguém que esteja do seu lado não para ficar falando em seu ouvido as coisas que deve fazer, mas a pessoa com a qual você possa andar ao lado sem o medo de que ela queira lhe fazer tropeçar. Alguém que vá pelo mesmo caminho que você. Eu sei que posso ser essa pessoa para você. Ao menos me diga o porque está tão hesitante em poder agarrar com todas as suas forças algo que está diante de seus olhos, e que pode ser seu desde que você queira.”

As palavras saíram como uma pedra atirada, e eu não poderia mais voltar atrás com nada do que eu havia acabo de dizer. Teria que ter os pés firmes e aguentar agora qualquer coisa que viesse da parte daquela moça. Tentei o máximo que pude me acalmar, e só então me virei de volta à Klara. Foi então que tive a maior de minhas surpresas.

Um rapaz estava ao seu lado.

Alguém que eu não sabia quem era, ou o porquê de ele estar ali ao seu dela, no meu lugar. Não consegui dizer uma palavra sequer e só consegui olhar, juntando as forças que eu tinha. Sim, quando vi aquela pessoa ali minhas forças foram se esvaindo e era como se tudo o que lutei, tudo o que pensei, tudo o que eu acreditei fosse mentira. Tudo o que eu podia fazer então naquele momento, era não desmoronar na frente de Klara.

A reação dela depois de ter ouvido tudo o que eu acabara de lhe dizer, e me surpreender vendo aquela cena, foi perguntar “Você deve estar sofrendo né?”. Virou-se para com o rapaz ao seu lado, abriu a porta que a tanto não conseguia nem encarar direito e adentrou em sua casa.

Silêncio.

Foi o que eu fiquei “ouvindo” durante todo o tempo que se passou. Não pensava, não ouvia, não conseguia enxergar e não era pela chuva, nem ao menos eu conseguia sentir o vento gelado sobre o meu corpo. Meu olhar estava fixo e vazio. Ali fiquei.

Muito tempo se passou, até que eu pudesse entender o que realmente havia acontecido. E se eu fosse esperar para que todas as perguntas que me vinham à cabeça fossem respondidas, eu ainda hoje estaria ali à frente daquela porta, esperando por algo que não viria.

Por que? Fui eu? Quem era ele? Desde quando ele estava presente à vida de Klara? O que ela queria? O que aconteceu? Onde ela está? Foi tudo mentira? O que ela sente? E quanto à o que eu sinto? O que acontece agora? O que eu deveria fazer? O que eu deveria tentar? Bater naquela porta? Sair daquele lugar? Chorar? Seguir em frente? Me lamentar?

Eu nunca vou saber ao certo nem metade das respostas que eu gostaria, para todas as perguntas que me fiz naquele momento. Estava eu em pedaços. Me senti naquele momento, como uma pequena criança, que constrói seu castelo de areia à beira do mar, e quando menos se espera, a maré sobe e leva seu pequeno castelo à baixo. Havia um silêncio enorme em meu coração e em meus pensamentos. Havia um silêncio enorme em mim.

Não sei quanto tempo ali fiquei parado, só sei que quando me vi, estava eu em minha casa e fazendo as minhas próprias coisas. Apesar de tudo o que acontecera, eu estava seguindo minha vida. Eu não poderia parar, pois a vida continua apesar de tudo o que acontece com nosso coração, e acho que meu próprio instinto fez com que eu seguisse assim.

Eu pensava muito em tudo que acontecera, os momentos felizes que passei por mais que tivessem sido poucos, foram sinceros pelo menos em meu coração. E pensar que tudo acabara daquele jeito. Sem que eu entendesse absolutamente nada, me deixava com um buraco no peito.

Eu nunca irei saber o que aconteceu, e agora tudo o que posso fazer é viver. Sigo meus dias como qualquer pessoa seguiria. Dou risadas, brinco e finjo muito bem ser feliz. Em certos momentos, principalmente quando vou me deitar, eu me lembro daquele sorriso, daquela pessoa, e me dói. Dói muito saber que enquanto eu nunca a esquecerei, ela vive a sua própria vida, sem que eu faça parte dela. Mas eu não tenho vergonha ou medo de sentir o que sinto.

Eu fui feliz com o que tive, e se me lembro e me importo hoje, é que realmente significou algo em meu coração ontem. Senti algo por nós dois, naqueles momentos, então terei que conviver com isso. Um pedaço de mim ali ficou, se algum dia em minha vida eu sentirei algo assim novamente, eu duvido muito. Pois algo tão sincero não acontece todos os dias.

Mas eu com tudo o que eu tenho em meu coração, posso afirmar com todas as letras que naquele momento de minha vida, eu amei Klara e sinto muito a sua falta, mas não sou eu a pessoa que irá cuidar de seu coração.

Segui minha vida, da maneira que eu consegui.

Obrigado por me ouvir, agora posso descansar em paz neste meu último resquício de minha vida. Tudo o que senti foi dito neste lugar, e acredito que algum dia eu ainda poderei descansar com meu coração tranqüilo, mas eu nunca me esquecerei da única pessoa que eu amei de verdade.

Te amei durante e além de minha própria vida.

Klara.


Fernando Vilela Paciencia

1 comentários:

... disse...

Mano! cai aqui por acaso, e estou em êxtase totaaaaaaaaaaaaaal!!!

isso aconteceu mesmo??
Se não se importa eu postei seu endereço de blogg no meu twitter... algumas pessoas precisam ver !

MEUS PARABÉNNNNS!

Postar um comentário

Deixe aqui o seu recado. =D