terça-feira, 29 de março de 2016
Coisas que Escrevo 51 - Freedy. Um viajante das Galáxias - 02
_ Olá, bom dia! Em que posso ajudar?
_ Com licença senhor, mas é aqui que dizem ser o melhor chaveiro que podemos encontrar?
_ Ora garoto, eu não sou de me gabar mas posso garantir que eu farei o melhor para atender as suas necessidades. Por favor, venha até minha sala para você me contar sobre o que precisa.
_ Obrigado.
_ Vamos, sente-se e me conte sobre como me encontrou e no que poderei ajudar?
_ Bom, por onde eu deveria começar?
Foi quando que esse pequeno viajante abriu sua mochila e de lá tirou dois punhados de aria. Colocou essa areia na mesa que havia entre os dois ali sentados e com ela começou a desenhar. Por incrível que pareça as areias tomavam formas e cores diferentes, sem que fossem colocadas nenhum outro ingrediente ou tinta capaz de tanto. Em meio a mudança das formas ele começou a história de como encontrou aquele nobre chaveiro.
"_ Como qualquer outro eu nasci, tive família e uma vida. Mas não vou começar a contar de tão antes assim e irei ao ponto do qual eu descobri a necessidade de conhecer o senhor. Como você pode dizer por me ver, eu sou jovem mas já tive muitas experiências em minha vida e partilho com carinho a maioria delas, mas tem uma que ainda não terminou e acredito que só o senhor vai poder me ajudar. Na época em que terminava meus estudos conheci alguém. Tudo começou de uma maneira que eu nada podia esperar. Um encontro casual durante o caminho de volta, a rotina de então esperar sempre a encontrar essa pessoa, sentir falta nos dias em que não aparecera. Tudo se tornou uma estranha coincidência a partir de quando a conheci. E isso me dava cada dia mais e mais vontade de estar por perto dela e aos poucos fomos tendo o que chamamos de relacionamento.
Por diversos dias tivemos essas mesmas rotinas de apenas nos encontrarmos, sairmos e vivermos o final de nossas noites juntos, porque era quando podíamos estar por perto devido aos nossos afazeres diários era o momento que tínhamos e com o passar dos dias eu posso dizer que nosso relacionamento ficou cada vez mais forte. Com tanto tempo assim dedicados um ao outro eu posso dizer que não demorou muito para ela conhecer cada detalhe de minha vida, minha família, meus amigos e meus sonhos e assim como eu lhe contava eu posso dizer que também a conhecia por cada pedacinho da estrela que ela era em minha vida.
Nosso primeiro beijo aconteceu e depois dele nada mais importava. Eu não sei como é possível viver depois de se presenciar o paraíso, e por mais que eu tentasse eu não conseguia tirar seus lábios de minha boca agora que os provara. Tivemos todos os momentos felizes juntos.Foi realmente um dos melhores tempos de minha vida.
É estranho perceber em como a maioria das coisas acontecem sem nos darmos conta. Dias se passaram e nem ao menos eu pude perceber que minha felicidade, como um relógio de areia, ia se esgotando a cada grão do tempo que se exauria.
Em uma noite qualquer, depois que já havíamos chegado e conversávamos como de costume ela me disse que precisaria ir embora. Eu não entendi exatamente o que aquilo significava, por isso quis saber mais sobre o que estava a acontecer com aquela que era o motivo do meu sonhar, mas por alguma razão, não importava o quanto eu perguntasse ou a maneira que tentava esclarecer minhas dúvidas, ela parecia não estar confortável em falar sobre e tudo o que eu soube era que ela não queria mais a felicidade que eu estava a lhe proporcionar.
Mas por que? É tão ruim assim ser feliz? Qual é o problema em ter alguém para si? Por que justo depois de tudo o que passamos, depois de todo o tempo doado e da vida compartilhada alguém só decidir que não quer mais ser feliz?
Sim, eu havia doado minha vida e demorei muito para entender o significado dessas palavras. Eu só entendi depois dela ir. Eu esperei em nosso mesmo lugar e ela não apareceu.
Os dias passaram e eu nunca mais a vi, e foi aí que eu percebi que um pedaço de mim não estava mais como antes. Muita dor eu conseguia sentir. Chorar foi uma das primeiras coisas que eu consegui fazer por sentir aquela dor insuportável de não entender algo que parecia tão certo. Depois das lágrimas meus pensamentos se inundaram de dúvidas sobre o quanto eu posso ter feito tudo acabar por falar ou não falar, fazer ou não fazer alguma coisa. Essa dúvida era como uma faca cortando minha pele e com essa dor eu só fazia chorar e chorar de novo. Passei por muito tempo chorando até que eu entendesse que agora eu estava sozinho, e que como antes de conhecê-la eu deveria voltar a viver, mesmo que para tanto eu deixaria de lado a felicidade que eu nunca mais encontrara.
Medo por fazer alguém feliz, por mais estranho que possa parecer foi a última coisa pela qual passei e foi nesse momento que eu pude pensar em minhas ações e entender aquilo que não parecia ter solução.
O pedaço em mim que não era mais como antes era meu coração.
O fato de eu me doar, compartilhar e viver minha vida com alguém fez com que eu tivesse dado uma parte do meu eu a outra pessoa, e agora isso não pode mais acontecer. Meu coração está totalmente aberto, exposto, machucado, sentindo essa dor imensurável e com isso eu percebo que quando ela me deixou, levou consigo a chave de meu coração.
Ela sempre que estava comigo, abria-o para despejar seus sentimentos, carinho, cumplicidade, tristezas, alegrias e principalmente amor. Uma vez dentro de mim compartilhávamos dos mesmos sentimentos e eu conseguia assim fazê-la totalmente feliz como ela já havia me dito por diversas vezes, e acredito que talvez por eu ter acreditado tanto em nós que acabei dando algo tão meu para ela. Só que quando ela se foi, por nada eu saber, me dá a impressão de que ela foi levando consigo o bem mais precioso que poderia estar de posse e quando ela percebera isso me deixou o mais breve possível. A chave do coração de outra pessoa pode não ter um valor material, mas no nosso mundo nada mais é importante do que um sentimento e o amor é e sempre vai ser o nosso bem mais precioso.
Foi então que eu parti também em busca de uma forma de conseguir voltar a ter posse de minha chave para voltar a ser quem um dia eu fui e tentar mais uma vez ser feliz. Eu no caminho encontrei quem se dizia apto a conseguir me fazer uma nova chave, mas por mais de uma vez, nunca era realmente a mesma chave do meu coração. Algumas até chegaram perto mas a chave era de barro, lata, madeira, ferro ou qualquer outro material que se quebrava em algum tempo depois. Mais e mais meu coração ficava aberto e mais e mais dor eu ia sentindo a cada nova tentativa.
Depois de muito procurar, em vários outros planetas, em algum lugar ouvi que o senhor era o único que poderia me ajudar e por isso vim aqui, tentar por mais uma vez."
Nesse momento, o senhor chaveiro, que passou todo o tempo ouvindo aquele garoto que ali chegara, prestado atenção em todas as formas que iam sendo desenhadas na areia conforme a história se desenrolava se levantou. Ele foi até uma outra mesa que parecia ser o local onde trabalhava, devido às ferramentas e a quantidade de chaves sejam terminadas ou só iniciadas, e no meio de todas elas ele puxou uma e se voltou a mesa.
_ Aqui está meu garoto, esta é a chave de seu coração.
O garoto pegou a chave de suas mãos e a olhou atentamente, tentando lembrar de cada detalhe. Ela se parecia muito com a que uma dia ele entregara a pessoa que amara a muito tempo, mas só havia um jeito de ter certeza e foi nessa hora que ele se voltou ao punhado de areia e como um livro que se folheia, toda a sua história foi se repetindo pelas imagens que voltavam a se formar e o mais incrível é que em cada parte da história aquela chave que acabara de receber se encaixava perfeitamente como que se nunca tivesse saído dali.
_ Como? Como pode o senhor já a ter em mãos?
_ Hahahahaha, ah meu garoto. Você acha que é o primeiro a me pedir tal coisa? Infelizmente não. Mas tem uma coisa que nenhum dos meus clientes percebeu. Nenhum deles percebeu que a chave de nossos corações são todas iguais.
E dizendo isso, o senhor chaveiro retirou uma chave de seu coração e entregou ao garoto que da mesma maneira fez o teste em suas areias, e para surpresa daquele que viera de tão longe, ela também se encaixava perfeitamente em sua história.
_ Eu não consigo acreditar!? Como? Se eu procurei em tantos lugares e elas nunca pareciam iguais, por que agora ela se parece exatamente como a de outra pessoa? Não, deve ser mentira! O senhor está a me enganar de alguma maneira!
_ Não garoto, não estou enganando a você e quero que preste atenção em minhas palavras. Eu posso dizer com certeza que eu já vivi muitas coisas e assim como você já passei por diversas desilusões, alegrias, tristezas e principalmente muitos amores. Já fui o mais rico de nosso mundo, mas já estive também entre os mais miseráveis e com tudo isso eu pude aprender sobre o que existe em nossos corações. A pessoa por qual você se apaixonou, pode ter levado sua chave com ela, mas pode ter certeza que você também tinha a chave de seu coração com você. É uma troca. Quando nos doamos a esse ponto tão puro, cada um entrega sua chave para a outra pessoa como forma de confiança e da vontade que temos de construir um caminho juntos. Nem tudo acontece como esperamos e acaba que em algumas vezes tudo se acaba. O tempo é muito relativo, o pouco de uns é o muito de outros então não é possível se medir de uma maneira exata e o que posso dizer com certeza é que se deve viver cada segundo em que se passam juntos. E é assim que você viveu com a pessoa que amou. Cada segundo passou como se ele fosse durar para sempre e a dor que sentiu quando terminou é por ter perdido a pessoa que você imaginava ficar para sempre. Mas isso não deve nunca ser um fim, mas um ciclo para algo novo que pode vir a ser melhor que o que passou se você se permitir ser feliz de novo. Você me disse que mudou depois do que aconteceu, mas foi uma escolha em que você por medo de sentir de novo essa dor se fechou e por mais que tentassem ficar do seu lado, nunca se encaixariam na sua vida, por isso você nunca mais viu as chaves que lhe davam como a sua chave. Você é o único responsável pelos seus sentimentos e deve a você cuidar daquilo que é só seu. Vai doer quando algo mudar, mas você não deve nunca se fechar para o mundo esperando por algo que não vai mais voltar sendo que pode ter algo ainda melhor se, e somente se, deixar acontecer a felicidade em sua vida.
_ Mas, mas, isso ainda não me explica como pode ter encaixado sua chave na minha vida!?
_ Não é que a minha chave se encaixou na sua vida meu garoto, mas acho que você agora já está em outro momento em sua vida, mais maduro e mais certo do que esperar. Portanto você agora está novamente aberto a procurar por alguém que queira compartilhar sua história com você. Essa chave é só uma chave qualquer, mas a sua chave sempre vai ser a sua felicidade. E quem fizer você feliz, será o dono da chave de seu coração.
Neste momento ambas as chaves que estavam na mão fechada do garoto começaram a ficar bem quentes e assim que ele abriu as mãos devido à súbita mudança de temperatura, elas viraram areia. Areia que caiu junto aquelas que já estavam postas em cima da mesa, areia que fazia parte de sua história, areia que agora trazia a verdade para seu coração.
O garoto agora chorava ao perceber que poderia ser feliz de novo e que tudo sempre iria depender apenas de entender os seus sentimentos e se permitir viver e ser feliz.
_ Obrigado senhor chaveiro. Não teria eu como lhe agradecer por tudo o que me ensinou hoje.
_ Não foi maior aprendizado para você, do que foi para mim ao ouvir mais uma linda história como a sua. Se meus serviços não são mais necessários, pode ir meu garoto e lembre-se que sua felicidade depende apenas do quanto você se permitir ser feliz.
O garoto puxou toda a areia para sua mala a colocando no frasco de onde a havia tirado, agora o frasco dois punhados mais cheio, mas ainda com muito para ser preenchido. Colocou sua mochila nas costas e saiu em direção a porta do chaveiro. Quando passou pela porta teve a leve impressão de ouvir um sussurro de despedida depois de dar seu adeus aquele senhor chaveiro que o ajudara tanto, mas seria impossível de ter ouvido aquelas palavras deste senhor chaveiro porque seria como se encontrasse alguém que a muito desejava e ali ele não deveria estar. Mas esse sussurro iria lhe acompanhar ainda por muito tempo.
Quando o garoto se despediu para ir em busca de seu caminho, aquele senhor chaveiro sussurrou.
_ Até mais, meu filho.
Fernando Vilela Paciencia.
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